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Palestrante diz que País vive “epidemia de homicídios” e destaca papel do Tribunal do Júri na defesa do direito à vida

“O Tribunal do Júri se presta à defesa da vida e da sociedade. Os jurados estão ali, em torno de um litígio estratégico, para fazer a diferença e dar um basta a essa matança que temos acompanhado. O promotor de Justiça fala em nome da vida que fora atacada, da família enlutada, da sociedade desfalcada e da comunidade indignada”. Essa foi uma das principais ideias defendidas pelo promotor de Justiça do Ministério Publico do Mato Grosso (MPMT), César Danilo Ribeiro de Novais, no webinário promovido, na manhã desta sexta-feira (9/10), pelo Ministério Público da Paraíba (MPPB).

Segundo o palestrante, o Brasil sofre uma “epidemia de assassinatos, causada pela arrogância, prepotência, ódio, intolerância e maldade humana”, com 60 mil homicídios registrados a cada ano. “A OMS (Organização Mundial da Saúde) diz que até 10 homicídios para cada grupo de 100 mil pessoas é tolerável. A Alemanha registra 0,5 homicídio/100 mil habitantes; o Chile, 6 homicídios/100 mil habitantes e, no Brasil, beiramos a 30 homicídios/100 mil habitantes, sendo que em alguns Estados passam de 100 assassinatos para cada grupo de 100 mil pessoas. É um quadro muito triste, que remete a trailer de filme de terror e que não podemos normalizar”, disse, acrescentando que é responsabilidade da sociedade e das instituições o enfrentamento desse problema.

O autor do livro “A defesa da vida no tribunal do júri" (cuja segunda edição foi lançada em 2018, abordando temáticas atuais como “colaboração premiada no júri”, “juiz presidente”, “prova indiciária”, “cumprimento imediato da pena no júri”, e “desaforamento interestadual”) lembrou que a Constituição Federal de 1988 coloca a vida no centro do sistema jurídico brasileiro e destacou o papel do Tribunal do Júri na defesa desse direito. “O Tribunal do Júri tem a competência para julgar os crimes dolosos contra a vida. É mais um dos mecanismos do sistema de proteção a esse direito. Não é um escudo de assassino; um tribunal especial criado como instrumento de defesa de quem está sendo acusado de ter se levantado contra o direito mais caro que temos”, disse, rebatendo as críticas de que esse tribunal é anacrônico e favorece a impunidade.

O palestrante fez uma retrospectiva histórica sobre o Tribunal do Júri, defendendo sua relação com as três gerações de direitos fundamentais. “Em um primeiro momento, o Tribunal do Júri surge como direito individual de o acusado ser julgado pelos seus pares e não pelo rei. Depois, temos a segunda dimensão, o direito de a sociedade participar da administração da justiça. Se o povo é dono do poder, nada mais justo que ele participe da administração da justiça através do Tribunal do Júri. A terceira vertente, que é esquecida propositalmente pela academia e por parte da comunidade jurídica, é o Tribunal do Júri como instrumento que se levanta pelo direito à vida e busca a paz social”, explicou.

Litígio Estratégico e necrodireito

Segundo Novais, litígio estratégico consiste em levar ao Judiciário um caso envolto numa estratégia. A matéria está relacionada à temática dos Direitos Humanos, sobretudo aos direitos das minorias. É um litígio simbólico e de impacto, que faz com que a sociedade reflita e se posicione sobre um fato.

Para o palestrante, é importante que os promotores de Justiça, como titulares da ação penal, façam de cada caso do Tribunal do Júri, um litígio estratégico, valendo-se do convencimento e da persuasão para engajar os jurados no objetivo de defender a vida, promover a justiça e uma cultura de paz.

O promotor de Justiça do MPMT também falou sobre necropolítica (conceito discutido pelo filósofo negro camaronense, Achille Mbembe, que, em 2003, escreveu um ensaio questionando os limites do poder do Estado, quando ele escolhe, por meio de políticas públicas ou da omissão dessas, quem deve viver e quem deve morrer). Ele problematizou essa ideia no contexto do Direito e do sistema de Justiça, trazendo termos como “necrodireito” (“o direito que mata”), “necrodialética” e “necro-hermenêutica”.

Para exemplificar isso, falou da importância para o Ministério Público brasileiro e para a sociedade do julgamento virtual iniciado nesta sexta-feira (9/10) pelo Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a possibilidade de o tribunal de segunda instância determinar a realização de um novo júri, caso a absolvição do réu tenha ocorrido em suposta contrariedade à prova dos autos. A matéria é objeto do Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 1225185, que, por unanimidade, teve repercussão geral reconhecida em sessão virtual (Tema 1087). Seu relator é o ministro Gilmar Mendes.

Segundo o palestrante, o crime organizado e a “lei do silêncio” que ele impõe às pessoas, preconceitos, misoginia, racismo e outras formas de discriminação podem fazer com que o júri absolva criminosos, a despeito das provas nos autos. “Não existe poder incontrolável no Estado Democrático de Direito. Não é possível haver uma convivência com um veredicto que desprestigia o direito à vida como aconteceu recentemente, quando o Supremo reconheceu a absolvição de um feminicida confesso, absolvido pelo júri, contrariamente às provas dos autos, devido ao machismo, um ranço da sociedade patriarcal. No dia em que o Supremo fez uma crítica ao Tribunal do Júri, ao invés de dar uma nova chance à sociedade de julgar novamente aquele caso para estancar aquela injustiça, ele corrobora a decisão desse julgamento”, criticou. 


O webinar

Participaram do webinar “Litigio estratégico no Tribunal do Júri” membros e assessores do Ministério Público brasileiro. O evento foi realizado pela plataforma Zoom e transmitido, simultaneamente, pelo canal do Núcleo de Ensino à Distância do Centro de Estudos e Aperfeiçoamento Funcional do MPPB (Nead/Ceaf).

O seminário online foi apresentado pelo promotor de Justiça do 1º Tribunal do Júri de João Pessoa, Marcus Leite, e teve como debatedor o também promotor de Justiça do MPPB, presidente da Associação Paraibana do Ministério Público, Márcio Gondim.

Ambos falaram sobre experiências vivenciadas na prática do Tribunal do Júri. Marcus Leite enfatizou que a competência desse tribunal é considerada cláusula pétrea e não pode ser mudada, exceto por uma nova Constituição. Já Márcio Gondim lembrou que esse tribunal existe desde 1822 (antes, portanto, da primeira Constituição do País, de 1824), e que foi evoluindo ao longo dos anos.

Também foi abordado no evento a importância de se conhecer profundamente o processo, de se usar linguagem acessível e objetiva na formulação da denúncia, para que ela seja compreendida pelos jurados (pessoas do “povo” que são, em regra, leigas em Direito), de se conhecer o perfil do conselho de sentença, do juiz presidente e do advogado de defesa para definir estratégias de convencimento e persuasão que promovam a justiça nos casos julgados.

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