Direito Sistêmico é uma nova forma de ver e resolver conflitos, defendem palestrantes
O Ministério Público da Paraíba (MPPB) promoveu, nesta segunda-feira (05/07), o curso online sobre Direito Sistêmico, uma nova concepção sobre o Direito e sua aplicabilidade, baseada na teoria e na técnica terapêutica das constelações familiares do alemão Bert Hellinger sobre conflitos e sua solução.
O evento idealizado pelo Núcleo Permanente de Incentivo à Autocomposição (Nupia/MPPB) e organizado pelo Centro de Estudos e Aperfeiçoamento Funcional (Ceaf/MPPB) foi destinado a membros, servidores e assessores do MPPB e também ao público externo, como defensores, advogados, juízes e outros profissionais interessados no assunto.
A coordenadora do Nupia, a promotora de Justiça Liana Carvalho, falou, ao abrir o curso online, sobre a importância desse novo olhar em relação aos conflitos e modos de solucioná-los, que vem sendo cada vez mais implementada no País.
Palestras
Quatro palestras foram ministradas durante o curso online. A juíza do Tribunal de Justiça do Mato Grosso, Tatiane Colombo, explicou o conceito de Direito Sistêmico e contou como teve contato com a técnica terapêutica das constelações familiares de Hellinger e como essa técnica pode ser aplicada no Direito. “Fiquei encantada com a possibilidade de trazer um olhar mais leve para o trabalho”, disse, resssaltando como os nossos sistemas de origem, com destaque para os pais, influenciam no nosso trabalho.
A palestra teve como debatedora a psicóloga, consteladora sistêmica e servidora do TJPE, Vivianne Freitas, que destacou a importância da subjetividade na solução de conflitos. “O evento foi maravilhoso, é um grande presente poder estar com pessoas com diferentes cargos no Judiciário e que tem um ponto em comum: a coragem de olhar além das decisões prontas e do entendimento ‘pacificado’. Poder enxergar que muitas vezes a verdadeira solução para um conflito passa por entender o que há por trás da lide, para o componente subjetivo, vivo, humano que existe em cada processo. Uma grande honra poder participar desse movimentão tão amplo”, disse.
Direito Sistêmico na área penal
A segunda palestra foi ministrada pela promotora de Justiça do Ministério Público do Estado de Pernambuco, Fabiana Raimundo de Lima, que falou sobre as práticas sistêmicas na área penal. Ela defendeu que essa nova concepção sobre o Direito e sua aplicação requer, antes de tudo, uma mudança pessoal. “O primeiro passo a ser dado no caminho das práticas sistêmicas é em nós mesmos, como indivíduo, no nosso sistema familiar e só por último na profissão. Essa postura inicial é fenomenológica, disponível ao que se mostrar, livre de intenções, julgamentos, medos e pena, assim, do centro e no nosso lugar vem nossa força sem nos emaranharmos ou adoecermos com pesos e compensações do sistema”, disse.
Seu debatedor, o promotor de Justiça do MPPB, Lúcio Mendes, discutiu as estratégias despenalizadoras do sistema penal, abordando as ordens sistêmicas e comparando-as com linhas criminológicas já existentes. Ele também questionou os critérios práticos para se definir em que casos se poderiam adotar as estratégias sugeridas pela palestrante, principalmente em se tratando de delitos praticados com violência.
Direito Sistêmico no Direito da Família
À tarde, a juíza do Tribunal de Justiça de Pernambuco, Wilka Vilela, e a facilitadora de constelações familiares junto ao Ministério Público de Minas Gerais, Dulce Helena, compartilharam as experiências desenvolvidas nos últimos anos. Um dos assuntos abordados e apresentados de forma prática pelas duas palestrantes foram as três leis de Hellinger (a lei do pertencimento; a lei da ordem e a lei do equilíbrio ou “dar e receber”).
Vilela falou sobre a aplicação dessa nova concepção do Direito e da técnica das constelações familiares em casos de alta litigiosidade nas Varas de Família, que já perduram por anos, que trazem reincidência e provocam grandes danos emocionais às partes envolvidas.
Segundo a juíza, essa nova forma de trabalho mais humanista, focada em um novo olhar sobre o conflito e sua solução, é capaz de resolver definitivamente o litígio. Ela explicou que essa técnica está amparada na Resolução 125/2010 do Conselho Nacional de Justiça (que versa sobre o direito consensual, promovido posteriormente no novo Código de Processo Civil de 2015) e na Resolução 180/2018 do TJPE. “Muitas famílias chegam dilaceradas em nossas unidades e nós (operadores do Direito) aprendemos a ser adversários e as partes não necessitam de litígios e de serem adversárias; há filhos envolvidos e muitas vezes, as partes nem se dão conta do mal que fazem a si e aos filhos. Quando aplicamos a técnica das constelações familiares, conseguimos resultados muito bons. Temos mais acordos firmados. Além de solucionar o conflito entre as partes, nós encerramos nossa tutela jurisdicional de forma definitiva, sem reincidências”, disse.
Essa palestra teve como debatedora a promotora de Justiça do MPPB, Carmem Perazzo, que destacou a importância do assunto para a prática do trabalho desempenhado no Ministério Público e encaminhou perguntas dos participantes, a exemplo de como identificar casos em que podem ser aplicadas as técnicas das constelações familiares, por exemplo.
Reconhecimento de paternidade
Dulce Helena, por sua vez, falou da experiência de trabalho desenvolvida junto com o Ministério Público de Minas Gerais em casos de reconhecimento de paternidade. Em 2019, ela ofereceu workshops com temas para sensibilizar as pessoas sobre a importância da presença do pai e da mãe. Um dos temas abordados foi o “vazio do pai”, em que destacou os prejuízos psicológicos e sociais que isso pode trazer para crianças e adolescentes. O objetivo era sensibilizar tanto as mulheres que tinham resistência em registrar o nome do pai dos seus filhos na certidão de nascimento deles, como os homens que não queriam reconhecer ou criar vínculos afetivos com os filhos.
Segundo ela, o trabalho de sensibilização, através do uso da técnica de constelações familiares, facilitou o diálogo entre as partes, aumentou o número de acordos e soluções extrajudiciais promovidas pelo MP, bem como o número de pais que se envolveram e criaram vínculos com os filhos.
A debatedora da última palestra foi a promotora de Justiça de Campina Grande, Rhomeika Porto, que lembrou que o MPPB está “dando os primeiros passos” dentro dessa nova perspectiva do direito e lembrou dos projetos já implementados pela instituição que vão ao encontro dessa nova concepção, como o projeto “Presente” (desenvolvido por promotorias de Justiça da Família para prevenir e combater a alienação parental praticada por genitores contra os próprios filhos, durante o processo de separação ou guarda) e “Nome Legal” (este último já virou uma rotina de trabalho na instituição, com o Núcleo de Promoção da Paternidade Nome Legal, o Nupar).